Fernanda Santos

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Acadêmica de Enfermagem (EEAN/UFRJ) Técnico em Enfermagem - Instituto de Pediatria Martagão Gesteira/ UFRJ.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Despedidas...

Não consigo entender (e olha que me esforço) a finitude de tudo. Se é um relacionamento, tem fim, seja por desgaste, seja pela morte de um dos conjuges. Se é uma sociedade, quebra financeiramente, ou os herdeiros não conseguem gerir, ou sei lá, acaba. Grandes impérios acabaram: Roma, Mesopotâmia, Grécia... Amizades, parcerias, sentimentos, dinheiro, até um chocolate, acho que tudo se acaba...

Pessoas são finitas. Já nascemos morrendo, pois nossas células estão em constantes mitoses e apoptoses... isso é necessário para manter o equilíbrio celular e orgânico. Pessoas morrem todos os dias, em todo o mundo, por causas diversas. Famílias ficam desestruturadas, "quantas mães choraram, quantas esposas ficaram por casar" (Luís de Camões - Os Lusíadas), quantas mães sentem seus braços vazios?

Estou falando deste assunto porque uma criança muito querida, que se tratava no hospital onde trabalho, faleceu na madrugada deste sábado. Eu não estava lá. Não pude abraçar aquela mãe, que acompanhei por meses, acolhi quando ela chegou no início do tratamento, conversamos tanto nas madrugadas, sobre a doença, as perspectivas de cura, sobre as artes que nossos filhos fazem. Não pude estar ao lado do menino que eu cuidei, que eu orei tanto a Deus pedindo pelo "milagre".

Outras crianças já partiram, adultos também (sim, já trabalhei com adultos...) e sempre me questiono "por que"? Como é o critério que Deus usa pra bater o martelo e decidir que alguém vai embora? Se Deus deu à ciência e a Medicina condições de avançar tanto, porque ainda temos que perder a batalha contra a morte?

Aí eu me consolo, pensando que nós não temos que lutar contra a morte. Seria o mesmo que lutar contra a correnteza de um rio, que leva diretamente para uma queda d'água. O curso do rio é imutável, cair é inevitável. Lutar contra a correnteza desgasta, deixar fluir permite que observemos a paisagem nas margens. Não me cabe a decisão de quem vai ou quem fica (graças a Deus!!!!), mas Deus me deu uma missão maravilhosa: cuidar.

Entendo a enfermagem como a arte de cuidar das pessoas, em todas as etapas de sua vida. E encerrar o ciclo, afinal, é também uma etapa importante. Creio que o enfermeiro deve estar sim ao lado do seu cliente nos seus momentos derradeiros, segurar-lhe a mão, permitir que sua partida seja tranquila (mantendo o ambiente livre de barulhos desnecessários, organizado e limpo) e que a família esteja presente, elabore o luto, e se despeça dignamente de seu ente querido.

Sou contra a medicalização e hospitalização da morte. Acho que seria muito melhor para a pessoa e sua família se a morte se desse em casa, cercado pelos seus, em seu leito, e não no ambiente hospitalar, cercado de monitores, soros, máquinas... acho que dói mais. Até o velório, que antigamente era em casa, agora é tão impessoal, nas capelas por aí, uma sala quadrada, sem nada que seja familiar... Posso parecer antiquada, mas realmente prefiro o morrer de antigamente.

E aí, fico triste por não estar ao lado do meu querido paciente, e de sua mãe. A minha presença não ia mudar em nada a dinâmica dos fatos. A doença crônica já havia exaurido aquela criança. Mas eu poderia cuidar deles neste momento, talvez sem usar uma única palavra, só com um abraço, por estar próximo, só para poder sussurrar em seu ouvido: Vai com Deus, nós te amamos.